Às
minhas margens restos poluídos
De
um modo de vida sem regras
Como
chagas tristemente abertas.
Minhas
águas já não correm tão livres
Apunhalam-me
diariamente, açoitam-me
Como
se eu fosse feito de um triste
Modo
que a todos desse o direito de escorraçar-me.
Aberto
e esquecido jamais se dignam de olhar-me
Fico
como se não existisse, um nada tolerado
Na
azáfama tremenda de um povo ingrato
Fio
de água sem serventia, todos a ignorar-me.
Toleram-me,
este povo, mendigo que sou
Nenhum
respeito possuem a quem lhes deu raízes
Às
minhas margens o ato, fato que ficou
Ruas
inteiras de escarro, urina e meretrizes.
Destroçaram
minhas matas ciliares,
Já
não possuo margens para expandir minha alma
Me
deixaram com o resto de um leito base
Roubaram-me,
até mesmo, o encanto de um espelho d'água.
Meu
sangue esverdearam, me poluíram
Já
não efluem de mim agradáveis odores
São
aqueles fétidos cheiros das muitas dores
Que
me impõem um povo ainda corrompido.
Não
se dão conta que estou morrendo aos poucos
Humilhado,
perdido, sufocado, cansado, melancólico
Deveria
encantar, ser amado, e não lama de porco
Chafariz
de vermes, cama de dejetos sólidos.
Sob
um céu de luz intensa me ponho a orar
Rogo
à deusa das estações que a subverta
E em
pleno verão há frio e a água a jorrar
Lembra
ao povo que há força maior e que não se esqueça.
Então,
lembram-se eles que existo e lhes dei a vida
Minhas
águas tomam deles minhas margens invadidas
Revigoro-me
uma vez mais, forte, bravo, cabeça erguida
Cavaleiro
a ceifar ruas, casas, sonhos e histórias esquecidas.
Estarrecidos
ficam e se lembram que simplesmente existo
Sou
o que lhes deu o nome, a origem, mas que já existia
Sou filho de uma deusa que é senhora do tempo, e isto
Sou filho de uma deusa que é senhora do tempo, e isto
É a
razão pela qual minhas águas transbordam de agonia.
Agora,
pois, voltam a se lembrar que sou Rei
Que
não podem me sufocar e ser o que fique
Apenas
a esperar que tenham o respeito ao muito que lhes dei
Porque,
por todo o tempo, sempre e tanto, serei o majestoso Rio Jacupipe.
Ailton São Paulo